top of page
Buscar

Falando sobre corações...

  • gildahelenapacheco
  • 22 de ago. de 2021
  • 2 min de leitura

Estudei em Colégio Salesiano durante a infância. Dentre tantas lembranças que trago em mim, guardo em especial os meses de junho no Colégio. Era o mês dedicado ao Sagrado Coração de Jesus.

De mãos dadas com a Irmã Elza, ia ao pomar ajudar a colher espinhos dos pés de laranja e limão. Guardávamos em uma caixinha e depois eles eram espetados em um coração de feltro vermelho, costurado pelas Irmãs do Colégio e que ficava aos pés da imagem de Jesus na Capela. Minhas mãozinhas sempre se feriam nos espinhos. Eu chorava.... Eu não aceitava espetar o coração. Eu me sentia totalmente incapaz de fazer aquilo. Era só um coração de feltro, e o gesto representava os agravos àquele Sagrado Coração. E eles ficavam ali, cravados e expostos todos os dias, até a hora da Missa. No final da celebração, era realizado o “desagravo” ao Coração de Jesus e os espinhos eram retirados um por um. Enquanto isso, jogávamos pétalas de rosas e cantávamos a música “Eu quisera....”, com os olhinhos cheios de fé e compaixão.

Junho sempre foi para mim o mês de “cuidar” do Coração de Jesus.

Minha missão sempre foi cuidar!

Na Faculdade, novamente me deparei com o “coração”. Já não era o de Jesus, mas peguei com minhas mãos o coração de pessoas anônimas, já sem vida. Toquei, dissequei, estudei muitos corações de cadáveres desconhecidos. Eu não lhes cravava espinhos, ali meus olhos estavam despertos para o aprendizado. Eu não podia ali cuidar, mas tocava-os com mãos de “MISERATIO-CORDIS”. Padre Firmo em suas missas, falava que misericórdia representava a junção dessas duas palavras em latim; portanto, significava coração compadecido. Era assim, com esse sentimento, que eu os tocava. Havia muita gratidão e respeito também. A capacidade emotiva do meu coração sempre me conectou com uma gama de sentimentos que somente os interpreto na sequência da linha de vida.

Em meus momentos, gosto de recordar os propósitos de minha vida. Ainda há em mim muito daquela menininha que chorava para não colocar espinhos naquele Coração Sagrado. Não podia ferir! Meu dom era cuidar! Meu dom sempre foi cuidar!

Cinquenta anos se passaram e hoje, em minha rotina de trabalho, passo horas tentando decifrar coraçõezinhos de bebês ainda no ventre materno. Rotina de um dia de agenda cheia de exames de ultrassom. Olho para minhas mãos e consigo enxergá-las como eram. Vejo ali que se misturam as minhas mãos com as mãozinhas daquela criança que fui, deslizando delicadamente o transdutor do aparelho de ultrassom para decifrar os enigmas do coração fetal, como se estivesse tentando retirar, piedosa e acertadamente, os espinhos cravados no coração de Jesus.

O tempo passou, mas o que é o tempo frente aos mistérios da vida?

A minha vida, o meu trabalho e as minhas emoções sempre estiveram conectados, como os batimentos do meu coração. Sincronizados. Rítmicos. Com a cadência de cada dia...

Peço a Deus que seja sempre assim. Até o dia em que, quem sabe, nada mais justo, que seja por ele, pelo coração, eu regresse à minha verdadeira Casa.


Gilda Pacheco

 
 
 

Comentários


  • Facebook B&W
  • Branca Ícone Instagram
bottom of page